pesquisa sonora e musical

por Marcelo S. Petraglia

Seja como compositor, músico ou professor, sempre senti um forte desejo de compreender o efeito que o som e a música têm sobre as pessoas e o meio ambiente. Pessoalmente acho que o músico tem uma alta responsabilidade social e sua atuação não é inócua, como às vezes pode parecer. Qual o significado e que sentido tem esse monte de tons e tempos que despejamos nos ouvidos dos outros? Como isso afeta as pessoas? Em que isso contribui para a harmonia ou caos do mundo? A quem ou a que ideal serve minha música? Acredito que o primeiro passo a ser dado para se chegar a respostas claras à estas perguntas, é buscar uma maior compreensão e sensibilidade em relação aos aspectos qualitativos e sutis da própria essência do som e da música. Para isso, torna-se necessário dirigir o olhar para os elementos mais simples e puros do fenômeno sonoro: o tom, o tempo, o fluxo sonoro, o silêncio… Ao mesmo tempo sinto que o som e a música têm um poder enorme e podem ser conscientemente usados como caminho de desenvolvimento e cura.

Todo o universo sonoro é, em primeiro lugar, o âmbito onde podemos desenvolver nossa audição, este sentido tão especial, que nos conecta com o interior das coisas. Segundo o filósofo Athur Schopenhauer, a música nos coloca em contato direto com a Vontade primordial e essencial do mundo e por meio dela podemos transcender as manifestações da natureza e mesmo as suas representações mentais, vivenciando de modo imediato as forças criadoras do cosmo.

Estudar e navegar por estas questões é e sempre será uma tarefa inesgotável, pois uma vez que percebemos a natureza musical de todas as coisas, tudo passa a ser música e portanto objeto de nosso interesse e prazer. O estudo da música (arte dos sons e do tempo) passa a ser assim um caminho de desenvolvimento de faculdades sensoriais e cognitivas que nos permitem em seguida perceber todos os processo da vida como “música”. A música se torna nossa escola e principal “órgão de observação”. A partir deste impulso de conhecer e operar o elemento sonoro-musical, surgiram no meu trabalho, vários ramos de atividade:

• Estudo da relação dos elemento básicos da música (melodia, harmonia e ritmos) e do som (altura, intensidade, duração e timbre) com a constituição física, anímica e espiritual do ser humano. Os resultados destes estudos tem sido compartilhados, principalmente através de curso, palestras e alguns textos neste site. Atualmente estão publicados no livro “A Música e sua relação como ser humano” e nos artigos deste site.

• Pesquisa sobre a influência de vibrações acústicas em substâncias. A partir do trabalho de Ernst F. F. Chladni (em torno a 1800) e Hans Jenny (na década de 60 e 70) Foram elaborados uma série de experiemetos que nos permitiram visualizar como um processo vibratório acústico pode ordenar, fazer fluir ou caotizar substâncias inertes, como: areia, farinhas, óleos, glicerina e água. O registro deste trabalho foi publicado em um CDrom “Figuras Sonoras”.

• O design de instrumentos musicais é sem dúvida um campo onde muitas das questões musicais se materializa, literalmente falando. Desde a procura em manifestar um som que a escuta interior captou, até a descoberta e revelação da sonoridade e potencial expressivo de cada material, tudo isso interage e busca um equilíbrio satisfatório para servir aos ideais musicais. Nesta busca, muitos instrumentos foram desenvolvidos, para fins artísticos, pedagógicos e terapêuticos. Alguns deles podem ser vistos na página “Instrumentos” deste site.

• A consequência natural de ter passado vários anos estudando as “Formas Vibratórias”, foi chegar ao ponto inevitável de lançar o olhar sobre o efeito de vibrações acústicas no âmbito da vida: os organismos. A opção foi estudar o efeito que estas influências poderiam ter sobre os organismos vegetais e isto se transformou em um projeto de mestrado, realizado no Instituto de Biociências da UNESP de Botucatu-SP. A pergunta quase folclórica e tão polêmica “podem o som e a música influenciar as plantas?” tornou-se o centro das nossas atenções. A resposta encontrada foi claramente “sim”, mas o fenômeno revelou-se tão complexo e rico em níveis de interação que sentimo-nos perplexos e impossibilitados de formular qualquer hipótese ou explicação simplista e utilitária sobre o assunto. Os interessados podem conhecer melhor a metodologia e os resultados lendo a dissertação “Estudos sobre a ação de vibrações acústica e música em organismos vegetais”, disponível neste site.

• Por fim, nosso mais novo campo de estudos é o próprio ambiente sonoro: todo lugar tem um som e todo som tem seu lugar. As qualidades sonoras de um ambiente são sua “trilha sonora” e tanto revelam quanto criam sua alma. Compreender esta relação me parece fundamental para uma consciência realmente ecológica e integradora. Normalmente o elemento sonoro é abstraído do contexto e nem nos damos conta de que ele está lá, nos influenciando e nos “afinando” segundo suas qualidades. Investigar os conceitos bem como a realidade do que chamamos de “Integridade auditiva”, “Esquizofonia”, “Lixo sonoro”, “Som de fundo”, “Território sonoro”, “Marco sonoro”, entre outros, é o ponto de partida deste estudo. Em seguida, como propõe R. Murray Schafer, devemos desenvolver as possibilidades de agir como compositores e orquestradores da nossa paisagem sonora local e coletiva.

Pode-se conhecer e fazer sempre mais…

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