por Marcelo S. Petraglia
capítulo do livro “A música e sua relação com o ser humano”
Por mais que já se tenha falado e pesquisado sobre nossa relação com o tempo, ele é um fato da vida sobre o qual não possuímos nenhum poder e que, por isso, nos fascina e amedronta. Usamos (até vendemos) o tempo, mas não temos sua posse. Criamos e utilizamos medidas que nos servem para organizar os fatos históricos e cotidianos da vida, mas sabemos que nossa vivência do tempo escapa ao cronômetro.
Devemos lembrar que o tempo é algo indissociável do elemento do movimento. Tempo é fluxo. Um fluxo contínuo e amorfo, expressão da vontade primordial que impulsiona cegamente todo o plano da existência em seu devir. Assim, em seu estado bruto, esse impulso não conhece ordem ou regularidade1. Caracterizar essa dimensão do elemento temporal puro não é tarefa fácil, pois ela se desenrola em uma camada da realidade à qual não temos acesso com nossa consciência ordinária. Fluímos com o tempo, como se estivéssemos entregues a um rio selvagem, sem obstáculos, sem retorno ou pontos de referência e, neste estado, confundimos nossa consciência com o próprio rio. Somente graças aquilo que se impõe como resistência a este fluxo é que temos a percepção de sua passagem.